1.Evolução histórica do Estado de necessidade
O estado de necessidade, diferentemente da legítima defesa,
justificativa que sempre existiu, desde as mais remotas legislações,
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Admitia-se o estado de necessidade, mas com aplicação apenas em casos
particulares, como furto famélico, aborto para salvar a vida da
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Situações injustas como essa existiam, pois o estado de necessidade
carecia de apoio doutrinário e maneira geral de tratamento a fim de
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fato; outros entendiam que era suprimida a injuricidade: desde que, no
conflito de interesses, era posto a salvo o preponderante, o estado de
necessidade tornava factum licitum o sacrifício do direito menos
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Após esta fase, a doutrina passou a considerar que, em alguns casos no
estado de necessidade não há crime, é dizer: o fato necessitado é
lícito.
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2. Teoria diferenciadora do estado de necessidade
A teoria diferenciadora a respeito do estado de necessidade teve origem
na Alemanha em 1927.
O ordenamento jurídico alemão previa duas formas de estado de
necessidade: a) estado de necessidade jurídico-penal: causa de exclusão
da culpabilidade (art. 54 do revogado Código Penal alemão); b) estado
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vida da gestante, a doutrina e jurisprudência alemã passou a construir,
sob influências de idéias jusnaturalistas, o estado de necessidade
justificante "supralegal", com fundamento no princípio da ponderação de
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O princípio da ponderação de bens e deveres tem incidência apenas no
estado de necessidade justificante, posto não conseguir fundamentar a
impunibilidade do fato necessário quando esses bens e deveres sejam de
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nestas últimas situações, que traduzem comportamento ilícitos, incidem
a excludente de culpabilidade – estado de necessidade exculpante. Daí a
necessidade do tratamento bifronte dado ao estado de necessidade pela
teoria diferenciadora.
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amparo legal, a exclusão da antijuridicidade em determinadas situações
de estado de necessidade, consagrando a denominada "teoria
diferenciadora", acolhendo duas formas de estado de necessidade,
ulteriormente, incorporadas ao texto legal, isto é, estado de
necessidade justificante (excludente de ilicitude) e estado de
necessidade exculpante (excludente de culpabilidade), assim elucidadas
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se afogando na piscina (sacrifício de valor menor para salvar valor
maior) estará amparado pelo estado de necessidade como excludente de
ilicitude. Já o exemplo clássico do caso de dois náufragos que disputam
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O Código Penal de 1890 foi mais rígido do que o atual na configuração
do estado de necessidade, que assim preceituava no art. 32: Não serão
também criminosos: 1) os que praticarem o crime para evitar mal maior".
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O Código Penal vigente optou pela teoria unitária, isto é, consagra o
estado de necessidade como excludente de criminalidade, sem as
restrições adotadas pela legislação alemã, não estabelecendo
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"Considera-se em estado de necessidade que pratica o fato para
salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia
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Mas essa orientação não é pacífica. Para alguns o Código Penal prevê,
embora impropriamente, no seu art. 24, tanto o estado de necessidade
que exclui a ilicitude como aquele que exclui a culpabilidade. Para
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A maioria dos doutrinadores orienta-se no sentido de que o art. 24 do
Código Penal só trata do estado de necessidade como excludente de
ilicitude. Dentre eles, temos: Paulo José da Costa Júnior, Alberto
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"A legislação vigente, adotando fórmula unitária para o estado de
necessidade e aludindo apenas ao sacrifício de um bem que, nas
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outro). Em tais casos subsiste a ilicitude e o que realmente ocorre
é o estado de necessidade como excludente da culpa (inexigibilidade
de outra conduta) (...)" (4)
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"O estado de necessidade é excludente da ilicitude quando, em
situação de conflito ou colisão, ocorre o sacrifício do bem de menor
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razoavelmente exigível comportamento diverso, excluindo, pois, a
culpabilidade. O estado de necessidade previsto no art. 24 do CP
vigente, portanto, pode excluir a antijuridicidade ou a
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"O estado de necessidade exculpante pressupõe a existência do
injusto, isto é, de uma ação típica e antijurídica, o que
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O art. 24 do Código Penal vigente mantendo a redação originária do
anterior permaneceu fiel à teoria unitária, que explica o estado de
necessidade como excludente de ilicitude, quer quando o bem jurídico
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"Admitir que todo e qualquer estado de necessidade é justificante
leva à aceitação, como conseqüência inafastável, de que no exemplo
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5. Estado de necessidade exculpante no Direito Penal Brasileiro
Nossa legislação, como já observado, adota a teoria unitária sobre o
estado de necessidade, uma vez que não existe comparação de valores
entre os bens jurídicos postos em perigo. Apenas exige que o agente
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b) o estado de necessidade exculpante, que funciona como causa
supralegal de exclusão da culpabilidade".
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Se, diante dos seus atributos, não era de se lhe exigir conduta
diversa, exclui-se a culpabilidade, com base no estado de
necessidade exculpante. Se, no entanto, era de se lhe exigir outro
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Embora consagrada (no Brasil) a teoria unitária, segundo a qual só há
estado de necessidade como excludente de injuridicidade, admite-se o
reconhecimento do estado de necessidade exculpante (excludente de
culpabilidade) com fundamento na inexigibilidade de conduta diversa.
É certo que não está previsto na lei o estado de necessidade como
excludente de culpabilidade pela inexigibilidade de outra conduta, como
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pergunta: seria exigível, nas circunstâncias, um comportamento diverso?
Poderá, razoavelmente, invocar estado de necessidade exculpante. Na
verdade, embora não previsto em lei, caracteriza, perfeitamente, a
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alemã, espanhola e do natimorto Código Penal brasileiro de 1969,
tivesse adotado a teoria diferenciadora em relação ao estado de
necessidade, o que evitaria indesejáveis confusões.
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Indiscutível que independentemente de estar ou não previsto na
legislação, pode e deve ser o estado de necessidade admitido tanto como
excludente da ilicitude quanto como excludente da culpabilidade. Neste
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Entendemos que, para o reconhecimento do estado de necessidade
exculpante, é irrelevante estar ou não contemplado no Código Penal.
Isto porque, ainda que não se possa deduzir do ordenamento jurídico o
estado de necessidade exculpante, ainda assim poderá ser admitido como
causa supralegal de exclusão da culpa fundamentado pela inexigibilidade
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TAVARES, Heloisa Gaspar Martins. Estado de necessidade como excludente
de culpabilidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 508, 27 nov. 2004.
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Direito Penal